Era um anjo de Deus
Que se perdera dos Céus
E terra a terra voava.
A seta que lhe acertava
Partira de arco traidor,
Porque as penas que levava
Não eram penas de amor.
O anjo caiu ferido,
E se viu aos pés rendido
Do tirano caçador.
De asa morta e sem 'splendor
O triste, peregrinando
Por estes vales de dor,
Andou gemendo e chorando.
Vi-o eu, o anjo dos Céus,
O abandonado de Deus,
Vi-o, nessa tropelia
Que o mundo chama alegria,
Vi-o a taça do prazer
Pôr ao lábio que tremia...
E só lágrimas beber.
Ninguém mais na Terra o via,
Era eu só que o conhecia...
Eu que já não posso amar!
Quem nos havia de salvar?
Eu, que numa sepultura
Me fora viva enterrar?
Loucura! Ai, cega loucura!
Mas entre os anjos dos Céus
Faltava um anjo ao seu Deus;
E remi-lo e resgatá-lo
Daquela infâmia salvá-lo
Só a força de amor podia.
Quem desse amor há-de amá-lo,
Se ninguém o conhecia?
Eu só. E eu morta, eu descrida,
Eu tive o arrojo atrevido
De amar um anjo sem luz.
Cravei-a eu nessa cruz
Minha alma que renascia,
Que toda em sua alma pus.
E o meu ser se dividia,
Porque ela outra alma não tinha,
Outra alma senão a minha...
Tarde, ai!, tarde a conheci,
Porque eu o meu ser perdi,
E ela à vida não volveu...
Mas da morte que eu morri
Também a infeliz morreu.
(Almeida Garret)
Um comentário:
Belas palavras
Assim como bela és
Toda ternura é pouca quando se trata de um espaço tão cheio de sentimentos
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