26 de abril de 2010

Epigramas


I


À bela dama despojada
não lhe restava mais nada,
depois de batalhas ávidas.


Continuava, porém, tão bela,
que inveja dizia: “Àquela
ainda lhe restam as perolas...”


A bela dama despojada
não podia dizer nada.
(Não lhe restavam nem lagrimas.)

(Cecília Meireles)

25 de abril de 2010

Cantiguinha




Brota esta lagrima e cai.

Vêm de mim, mas não é minha.
Percebe-se que caminha,
sem que se saiba aonde vai.


Parece angustia espremida
de meu negro coração
- pelos meus olhos fugida
e quebrada em minha mão.


Mas é rio, mais profundo,
sem nascimento e sem fim,
que, atravessando este mundo,
passou por dentro de mim.

(Cecília Meireles)

24 de abril de 2010

Desterritorialização


"O nômade não tem pontos, trajetos, nem terra, embora ele evidentemente os tenha. Se o nômade pode ser chamado de o desterritorializado por excelência, é justamente por que a reterritorialização não se faz depois, como no migrante, nem em outra coisa, como no sedentário (com efeito, a relação do sedentário com a terra está mediatizada por outra coisa, regime de propriedade, aparelho de Estado...). Para o nômade, ao contrário, é a desterritorialização que constitui sua relação com a terra, por isso ele se reterritorializa na própria desterritorialização. É a terra que se desterritorializa ela mesma, de modo que o nômade aí encontra um território. A terra deixa de ser terra, e tende a tornar-se simples solo ou suporte. A terra não se desterritorializa em seu movimento global e relativo, mas em lugares precisos, alí mesmo onde a floresta recua, e onde a estepe e o deserto se propagam."
(Deleuze e Guattari)

22 de abril de 2010

Só...


"Se quem chegou, partiu
Se quem virá, já foi
Só pra quem fica os dias são todos iguais
Mil sonhos pra enterrar
Ventos e vendavais
Corpo e alma afetam
Se os anos pesam demais no coração"

(Leila Pinheiro)

Sinto-me vazia...
...E as palavras me faltam

19 de abril de 2010

A menina enferma



I

A MENINA enferma tem no seu quarto formas inúmeras
que inventam espantos para seus olhos sem ilusão.
Bonecos que enchem as grandes horas de pesadelos,
que lhe roubam os olhos, que lhe partem a garganta,
que arrebatam tesouros da sua mão.


Um dia, ela descobriu sòzinha que era duas!
a que sofre depressa, no ritmo intenso e atroz da noite
e a que olha o sofrimento do alto do sono, do alto de tudo,
balançada num céu de estrelas invisíveis,
sem contato nenhum com o chão.

II

A mão da menina enferma refratou-se também na água pura,
como, outras vezes, sua voz, nesses rios do céu.
Partiu-se a mão contemplativa dentro d'água:
mas não houve mesmo amargura, mas quase delícia,
no seu pulso quebrado e exato.
E ela contempla a onda mansa:
e tudo isso é uma simples lembrança?
é uma alheia notícia?
ou algum velho retrato?

III

A menina enferma passeia no jardim brilhante,
de plantas húmidas, de flores frescas, de água cantante,
com pássaros sobre a folhagem.
A menina enferma apanha o sol nas mãos magrinhas:
seus olhos longos tem um desenho de andorinhas
num rosto sereno de imagem.
A menina enferma chegou perto do dia tão mansa
e tão simples como uma lágrima sobre a esperança.
E acaba de descobrir que as nuvens também tem movimento.
Olha-as como de muito mais longe. E com um sorriso de saudade
põe nesses barcos brancos seus sentimentos de eternidade
e parte pelo claro vento.

(Cecília Meireles)

14 de abril de 2010

O Banquete


"Cedo à sofreguidão do estômago.
É a hora de comer. Coisa hedionda!
Corro.
E agora, antegozando a ensangüentada presa,
Rodeado pelas moscas repugnantes,
Para comer meus próprios semelhantes
Eis-me sentada à mesa!"

(Augusto dos Anjos)



Enquanto você pensa que me jogou no fundo do precipício,
eu estarei sobre a tua cabeça preparando o golpe de misericórdia.

By Morgana


13 de abril de 2010

As Deusas Sujas



Há um ser que vive no subterrâneo selvagem das naturezas das mulheres.
Essa criatura faz parte da nossa natureza sensorial e, como qualquer animal completo,
possui seus próprios ciclos naturais e nutritivos. Esse ser é curioso, gregário,
transbordante de energia em certas horas, submisso em outras. Ele é sensível a
estímulos que envolvam os sentidos: a música, o movimento, o alimento, a bebida, a
paz, o silêncio, a beleza, a escuridão.
É esse aspecto da mulher que tem cio. Não um cio voltado exclusivamente para
a relação sexual, mas uma espécie de fogo interior cuja chama cresce e depois abaixa,
em ciclos. A partir da energia liberada nesse nível, a mulher age como lhe convém.
O cio da mulher não é um estado de excitação sexual, mas um estado de intensa
consciência sensorial que inclui sua sexualidade, sem se limitar a ela.
Muito poderia ser escrito acerca dos usos e abusos da natureza sensorial
feminina e sobre como a mulher e outras pessoas atiçam o fogo à revelia dos seus
ritmos naturais ou tentam extingui-lo por completo. No entanto, em vez disso, vamos
Focalizar um aspecto que é ardente,decididamente selvagem e que transmite um
calor que nos mantém aquecidas com boas sensações. Na mulher moderna, essa
manifestação sensorial recebeu pouquíssima atenção e, em muitas regiões e períodos,
foi totalmente eliminada.
Existe um aspecto da sexualidade feminina que, nos tempos remotos, era
chamado de obsceno sagrado, não na acepção que damos hoje em dia ao termo, mas
com o significado de uma sabedoria sexual de uma certa forma bem-humorada.
Havia outrora cultos a deusas que eram voltados para uma sexualidade feminina
irreverente. Longe de serem depreciativos, eles se dedicavam a ilustrar partes do
inconsciente que ainda hoje permanecem misteriosas e em grande parte desconhecidas.


A própria idéia da sexualidade como sagrada e, mais especificamente, da
obscenidade como um aspecto da sexualidade sagrada, é vital para a natureza
selvática. Havia deusas da obscenidade nas antigas culturas matriarcais — assim
denominadas por sua lascívia astuta, porém inocente. Contudo, a linguagem, pelo
menos no inglês, dificulta a compreensão das "deusas sujas" como algo que não seja
vulgar. Eis o que a palavra suja e outros termos a ela relacionados significam.
• Dirt (sujeira): Inglês Médio, drit, provavelmente do islandês — excremento.
Significado ampliado para incluir imundície; geralmente, o solo e a poeira, por
exemplo, e obscenidade de qualquer natureza, especialmente na fala.
• Dirty Word (palavrão): uma palavra obscena, também usada atualmente
para designar qualquer coisa que tenha se tornado impopular ou suspeita em termos
sociais ou políticos, muitas vezes através de difamação e críticas imerecidas ou por
estar em descompasso com as tendências atuais.
• Obscene: do hebraico antigo, ob, significando um mago, uma feiticeira.
Tudo isso, difamação. Existem, porém, fragmentos de histórias em toda a
cultura mundial que sobreviveram a vários expurgos. Eles nos informam que o
obsceno não é absolutamente vulgar, mas que lembra mais alguma criatura fantástica
da natureza que desejamos muito que nos venha visitar e que venha a ser uma das
nossas melhores amigas.
Ficou evidente para mim que a importância dessas antigas deusas da
obscenidade estava na sua capacidade de soltar o que estava muito preso, de fazer
dissipar a melancolia, de trazer ao corpo uma espécie de humor pertencente não ao
intelecto, mas ao próprio corpo, de manter desobstruídas as passagens. É o corpo que
ri das histórias de coiotes, das histórias de Tio Trungpa, dois das frases de Mae West,
entre outras. As deusas sujas fazem com que uma forma vital de medicamento
neurológico e endócrino se espalhe por todo o corpo.

(Texto retirado do livro: Mulheres que correm com os lobos - Clarissa Pinkola Estes)

11 de abril de 2010

Sear me MCMXCIII




Se encaixe em mim

Nossa hora se aproxima

Tão rápido, que eu suspiro.

Qual perigo em tal adorador?



Nós dançamos enquanto a música morre
Nós os deixamos fascinados enquanto brilhávamos em seus olhos perdidos
Você me elevou acima de mim mesmo com o fantasmagórico lago de sua mente
Desperte de seu sono em meus braços
Sua beleza extraiu toda minha força



Nos prados celestes corremos através das estrelas
O Romântico em nossas essências



Nós estamos sem desculpas
Nós nos queimamos em nossa luxúria
Morremos em nossos olhos e nos afogamos em nossos
braços.

(My Dying Bride)


7 de abril de 2010

Toma-me



Toma-me. A tua boca de linho sobre a minha boca
Austera. Toma-me AGORA, ANTES
Antes que a carnadura se desfaça em sangue, antes
Da morte, amor, da minha morte, toma-me
Crava a tua mão, respira meu sopro, deglute
Em cadência minha escura agonia.

Tempo do corpo este tempo, da fome
Do de dentro. Corpo se conhecendo, lento,
Um sol de diamante alimentando o ventre,
O leite da tua carne, a minha
Fugidia.

E sobre nós este tempo futuro urdindo
Urdindo a grande teia. Sobre nós a vida
A vida se derramando. Cíclica. Escorrendo.
Te descobres vivo sob um jogo novo.
Te ordenas. E eu deliquescida: amor, amor,
Antes do muro, antes da terra, devo
Devo gritar a minha palavra, uma encantada
Ilharga

Na cálida textura de um rochedo. Devo gritar
Digo para mim mesma. Mas ao teu lado me estendo
Imensa. De púrpura. De prata. De delicadeza.


(Hilda Hilst)

6 de abril de 2010

Há momentos...


Há momentos na vida em que sentimos tanto

a falta de alguém que o que mais queremos
é tirar esta pessoa de nossos sonhos
e abraçá-la.

Sonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que se quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes
não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor
das oportunidades que aparecem
em seus caminhos.

A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passam por suas vidas.

O futuro mais brilhante
é baseado num passado intensamente vivido.
Você só terá sucesso na vida
quando perdoar os erros
e as decepções do passado.

A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar
duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar
porque um belo dia se morre.

(Clarice Lispector)

4 de abril de 2010

The crown of sympathy




Veja a luz e sinta o meu desejo quente
Correr através de suas veias como o sol da noite
Ela irá viver, mas sem olhos para ver
Vou abençoar o seu nome antes de morrer
Ninguém pode brilhar em tudo
No entanto, você brilhou para o mundo ver
Tudo tem que lhe dar a vida?
O sangue da vida que se perdeu corre em mim por toda noite

Eu tinha caído antes, mas nunca foi assim
Não me deixe aqui a rastejar pela lama
Estou sem culpa diante do trono de Deus
Tire-me a coroa da simpatia

O que você acha que vai ver?
O que você acha que vai haver?
Sente-se!
Você viu o sol?
O que será que nos tornamos?
Os grandes?

As bocas que não ousam dizer seu nome
Eis-los, levantaram-se, completos e puros
A batalha pelas nossas vidas é tão breve
Pegue minha mão e caminhe comigo por favor
Quando eu era jovem o sol queimou meu rosto
Eu deixei o seu amor derramar calor sobre mim

A voz de fusão de muitos, no silêncio da noite
Sussurrando línguas que podem envenenar a minha verdade digna
Vamos, vista-me com o teu corpo e me conforte

Eu sonhei com uma criança morta em meu sono
Eu tenho uma marca terrível em minha cabeça

Minha cama branca e limpa...
Me chama...
Devo deitar-me...
E quero que você esteja comigo... na simpatia
Nenhum triste "adieus" na varanda...
Pela última vez, apenas caminhe comigo...
No belo portão do templo, temos de ser salvos
Para amortecer a dor, o gelo cobre toda a terra...
(My Dying Bride)



3 de abril de 2010

In the dark... alone



Olhando para baixo em ruas vazias, tudo que ela pode ver
são os sonhos todos tornados sólidos
são os sonhos tornados reais

todos os edifícios, todos aqueles carros
eram apenas um sonho
na cabeça de alguém

ela retrata o vidro quebrado, ela retrata o vapor
que retrata uma alma
sem nenhum escape na emenda

vamos trazer o barco para fora
esperar até a escuridão
vamos trazer o barco para fora
esperar até que a escuridão venha

em nenhuma parte nos corredores de verde pálido e cinza
em nenhuma parte nos subúrbios
na luz fria do dia

lá no meio de tudo, tão viva e só
palavras suportam como ossos...

(Peter Gabriel - Mercy street)

1 de abril de 2010

O Julgamento

O Julgamento indica a urgência da manifestação. Tudo que está para acontecer, acontece. Tudo que está empacado, desempaca. Tudo que era apenas projeção para o futuro, rola. O futuro é aqui e agora, assim diz o Julgamento.

O Arcano 20 também é consequência: o que foi plantado é colhido. Se nada foi plantado, não há colheita. Se o que foi plantado não foi bacana, o corpo (e a mente) padece. Se foi uma boa semente então belos sonhos serão colhidos. Simples assim!

Há também uma tradicional interpretação do Julgamento que fala de revelação e auto-revelação, quando descobrimos algo sobre nós mesmos que ainda não sabíamos.

O Julgamento é uma carta de Tarot que significa separação entre passado e futuro.

A imagem da ressurreição dos mortos simboliza a passagem de um estágio a outro – geralmente mais positivo. No plano afetivo, acena com a perspectiva de recomeço, perdão e redenção.

Esta carta traz a imagem de um anjo tocando uma trombeta de ouro. Embaixo dele uma pessoa sai de um túmulo e é recebida por outras duas. O renascimento é anunciado de maneira forte como o som. Como um despertador poderoso este arcano nos chama ao despertar. Recomeçar planos que foram adiados, possibilidade de dar um novo sentido à vida.

(Texto retirado da net)