9 de julho de 2010

Uma Extraordinária Aventura



A tarde ardia em cem sóis
O verão rolava em julho.
O calor se enrolava no ar e nos lençóis
da data onde eu estava,
Na colina de Púchkino, corcunda,
o monte Akula, e ao pé do monte
a aldeia enruga a casca dos telhados.
E atrás da aldeia,um buraco
e no buraco, todo dia,
o mesmo ato:

o sol descia
lento e exato
E de manhã
outra vez
por toda a parte
lá estava o sol
escarlate.
Dia após dia

Isto
começou a irritar-me
terrivelmente.
Um dia me enfureço a tal ponto
que, de pavor, tudo empalidece.
E grito ao sol, de pronto:

- Desce!

- Chega de vadiar nessa fornalha!

E grito ao sol:

- Parasita!

- Você aí, a flanar pelos ares,
e eu aqui, cheio de tinta,
com a cara nos cartazes!

E grito ao sol:

- Espere!

- Ouça, topete de ouro,
e se em lugar
desse ocaso de paxá
você baixar em casa
para um chá?

Que mosca me mordeu!
É o meu fim!

Para mim
sem perder tempo
o sol alargando os raios-passos
avança pelo campo.

Não quero mostrar medo.
Recuo para o quarto.
Seus olhos brilham no jardim.
Avançam mais.
Pelas janelas,
pelas portas,
pelas frestas
a massa solar vem abaixo
e invade a minha casa.

Recobrando o fôlego,
me diz o sol com a voz de baixo:

- Pela primeira vez recolho o fogo,
desde que o mundo foi criado.
Você me chamou?
Apanhe o chá,
pegue a compota, poeta!

Lágrimas na ponta dos olhos
o calor me fazia desvairar, eu lhe mostro
o sofá:

- Pois bem,
sente-se, astro!

Quem me mandou berrar ao sol
insolências sem conta?

Contrafeito
me sento numa ponta
do banco e espero a conta
com um frio no peito.

Mas uma estranha claridade
fluía sobre o quarto
e esquecendo os cuidados
começo pouco a pouco
a palestrar com o astro.

Falo disso e daquilo,
como me cansa o trabalho,
etc.

E o sol:

- Está certo,
mas não se desgoste,
não pinte as coisas tão pretas.
E eu? Você pensa
que brilhar
é fácil?
Prove, pra ver!
Mas quando se começa
é preciso prosseguir
e a gente vai e brilha pra valer!

Conversamos até a noite
ou até o que, antes, eram trevas.
Como falar, ali, de sombras?
Ficamos íntimos,
os dois.
Logo,com desassombro
estou batendo no seu ombro.
E o sol, por fim:

- Somos amigos
pra sempre, eu de você,
você de mim.
Vamos, poeta,
cantar,luzir
no lixo cinza do universo.
Eu verterei o meu sol
e você o seu
com seus versos.

- O muro das sombras,
prisão das trevas,
desaba sob o obus
dos nossos sóis de duas bocas.
Confusão de poesia e luz,
chamas por toda a parte.

- Se o sol se cansa
e a noite lenta
quer ir pra cama,
marmota sonolenta,
eu, de repente,
inflamo a minha flama
e o dia fulge novamente.

Brilhar para sempre,
brilhar como um farol,
brilhar com brilho eterno,
Gente é pra brilhar
que tudo o mais vá prá o inferno,
este é o meu slogan
e o do sol.



(Vladimir Maiakóvski)

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