8 de dezembro de 2009

Jean Nicolas Arthur Rimboud


Esta semana fiz uma apresentação na faculdade sobre Arte e Transgressão. E para fazer o trabalho, eu e minha equipe escolhemos falar sobre Rimbaud, poeta francês, que foi um transgressor por excelência, pois, até hoje, nenhum poeta conseguiu aliar com tanta intensidade a transparência e o enigma.
Seus poemas eram feitos baseados em experiências da sua vida, conseqüentemente, ao transgredir a sua vida, ele transgredia a sua arte, que era a poesia.
Até hoje Rimbaud é fonte de inspiração para inúmeros artistas, e ele e sua poesia continuam como fonte de mistério para a modernidade. A poesia de Rimbaud se caracterizava pela heterogeneidade radical, pois, ele nunca era o mesmo, nunca se repetiu. Em seus poemas, ele procurava sempre romper com qualquer tipo de tradição literária e cultural. Rompia com qualquer gênero poético, literário e até gramatical em sua escrita. Rimbaud afirmava que um dos pontos mais importantes, mais essenciais para o seu projeto poético era a busca do desconhecido através do desregramento de todos os sentidos, o que ele chama de videncia, como afirma em sua obra Cartas do Vidente em 1871:

"O poeta torna-se vidente através de um longo, imenso e estudado desregramento de todos os sentidos. Todas as formas de amor, de sofrimento, de loucura; ele busca a si mesmo, prova todos os venenos, para guardar apenas a quintessência. Inefável tortura em que é necessária toda a fé, toda a força sobre-humana, quando ele se torna entre todos o grande doente, o grande criminoso, o grande maldito — e o supremo Sábio! — Pois chega ao desconhecido! Ele cultivou sua alma, já rica, mais do que qualquer outro! Ele chega ao desconhecido, e ainda que, enlouquecido, acabe perdendo a inteligência de suas visões, ele as viu!"

Porém, o desconhecido a que Rimbaud se refere não é uma desconhecido que se possa conhecer, e sim o desconhecido absoluto, que não será possível alcançar através de nossas faculdades sensoriais regradas, e sim com a desordenação delas. E isso era feito não como um delírio incoerente de previsão do futuro, mas, tomando como ponto de partida o próprio presente, na intenção de ter uma outra percepção superior da realidade na qual se está inserido.

Como conseqüência do desregramento dos sentidos Rimbaud alcançava o que ele chamava de Eu é um outro. Isso significa, antes de mais nada, que o eu rimbaudiano é múltiplo, vário, escorregadio, móvel, fragmentado; ele nunca está onde se quer, onde se pensa, pois é sempre outro, e escapa pelos dedos de quem tenta fixa-lo. À luz dessa constatação, qualquer tentativa de determinação seja do eu rimbaudiano seja de sua obra a partir desse eu — e mesmo qualquer determinação em si — perde, de saída, essa indicação fundamental dada pelo próprio poeta: Eu é um outro.

Nota-se que não se trata de Eu sou um outro nem de Ele é um outro, expressões que, embora pouco comuns, ainda pertencem a um enunciado homogêneo (eu sou e ele é não produzem nenhum tipo de heterogeneidade). Assim também ele afirma em Cartas do Vidente:

"Agora, eu me encrapulo o máximo possível. Por quê? Quero ser poeta e trabalho para tornar-me vidente: Você não compreenderá nada e eu quase que não saberia explicá-lo. Trata-se de chegar ao desconhecido através do desregramento de todos os sentidos. Os sofrimentos são enormes, mas é preciso ser forte, ter nascido poeta, e eu me reconheci poeta. Não é de modo algum culpa minha. É errado dizer: Eu penso: dever-se-ia dizer: sou pensado. — Perdão pelo jogo de palavras"

Qualquer tentativa de atribuir algum estilo ou cultura a Rimbaud seria diminuir a sua voz, enfraquecer suas descobertas, enfim, atenuar o que há em sua escrita de mais radical, que seria perder essa indicação fundamental pelo poeta: Eu é um outro. Rimbaud não fazia distinção entre bem e mal, feminino e masculino, inferno e paraíso, havia um apagamento de fronteiras entre o verso e a prosa, as palavras eram usadas não pelo significados, mas pelas sensações, pela sinestesia, os versos eram livres, negava qualquer tradição ou herança, tinha o estranhamento poético.

O que também mais fascina em suas obras foi o fato de terem sido feitas na sua juventude entre os 14 aos 19 anos, porém a linguagem e o conteúdo literário apresenta tamanha grandeza que parecem terem sido escritos por um sábio ancião. Aos 20 anos mais ou menos, Rimbaud pára de escrever.

Rimbaud nasceu em 20 de outubro de 1854, Charleville e morreu em 10 de novembro de 1891, Marselha aos 37 anos. Sua principais obras foram: Uma Temporada no Inferno e Iluminações (1973), Cartas do Vidente e Poesias (1871).

Tudo isto aqui descrito, faz de Rimbaud um poeta atemporal na arte e na história, transgressor na sua vida e na sua arte, pois como o mesmo dizia: "a minha arte é a minha vida"

Salve Rimbaud!!!!

Mau Sangue

"Herdo de meus antepassados, os gauleses, os olhos azuis-claros, a
fronte estreita, e a falta de jeito para a luta. Sinto que minhas roupas
são tão bárbaras quanto as deles. Apenas não unto a cabeleira.
Os Gauleses foram esfoladores de animais, queimadores de ervas, os
mais inábeis de seu tempo.
Deles, eu herdo: a idolatria e o amor ao sacrilégio; - oh! todos os
vícios: cólera, luxúria, - magnífica, a luxúria; - sobretudo mentira e
preguiça.
Detesto todas as profissões. Mestres e oficiais, todos campônios,
ignaros. A mão que empunha a pena equivale à que guia o arado. -
Que século de mãos! - Jamais me servirei das mãos! Depois, a
domesticidade leva demasiado longe. A honradez da mendicidade
exaspera-me. Os criminosos repugnam-me como castrados: quanto a mim,
estou intacto, e pouco se me dá.

Mas quem fez tão pérfida a minha língua que, até agora, tem guiado
e protegido a minha preguiça? Sem saber utilizar-me do corpo, e
mais ocioso que um sapo, tenho vivido por toda a parte. Não há
família na Europa que eu não conheça: - Estou falando de famílias
iguais à minha, que devem tudo à declaração dos Direitos do
Homem – Tenho conhecido cada filho-família!"

(Poema da obra: Uma Temporada no Inferno. Rimbaud, 1873)

Um comentário:

Merlim Thy Vamp disse...

Fantástico, Mel!

não poeria ter escolhido melhor simbolo de transgressão ( talvez Jim morrisson, mas aí a coisa seria tendenciosa...)

Um brinde aos que sabem cruzar a linha!